Relação entre estresse e depressão

Relação entre estresse e depressão

08 de maio de 2023

Estresse crônico como gatilho para desenvolver depressão

O estresse crônico pode ser um gatilho para o desenvolvimento da depressão, principalmente se o paciente tiver fatores genéticos que favoreçam essa predisposição. Compreender os mecanismos pelos quais essa relação acontece pode levar a ciência a encontrar novos alvos terapêuticos para o tratamento da depressão. Por isso as pesquisas de base ou pré-clínicas são tão importantes e valiosas.

Em um trabalho científico recente, um grupo de cientistas da Universidade Médica da Carolina do Sul identificou um gene regulado pelo estresse que pode estar envolvido com o estresse crônico e, ao mesmo tempo, com o comportamento do tipo depressivo.

Esse gene, o NPAS4, pareceu estar relacionado com perda de interesse em atividades que antes eram gratificantes ou prazerosas (anedonia) devido ao estresse de longo prazo. Ou seja, o gene representa uma associação entre estresse crônico e um sintoma depressivo.

Mecanismo cerebral da relação estresse x depressão

Em modelos animais, o estresse de longo prazo diminui o funcionamento do córtex pré-frontal. Os pacientes com transtorno depressivo também apresentam redução da atividade dessa região do cérebro, que parece estar relacionada aos sintomas depressivos.

O gene NPAS4 é conhecido por seu papel no funcionamento do córtex pré-frontal, agindo como um “regulador master”, podendo influenciar a forma como outros genes são expressos baseado na atividade cerebral dessa região.

Na pesquisa que identificou o papel do gene NPAS4 com o desenvolvimento de sintomas depressivos, os pesquisadores expuseram os animais a um protocolo de estresse crônico que desencadeou a ativação desse gene. Como consequência da ativação do gene NPAS4, a expressão de diversos genes foi alterada além de provocar uma redução da atividade do sistema de recompensa no cérebro desses animais.

Corroborando esse achado, pacientes com depressão também apresentam o gene NPAS4 ativado, com consequente alteração do padrão de expressão de outros genes. Por isso, os cientistas especularam que a relação entre a expressão do gene NPAS4 pode ser um fator crucial para o desenvolvimento de comportamento depressivo pós estresse de longo prazo.

O que podemos concluir sobre a relação estresse x depressão?

O gene NPAS4 não mostrou ter influência em outros sintomas comuns do tipo depressivo, como evitação social e aumento do comportamento do tipo ansioso. Ou seja, a descoberta de que esse gene afetou apenas um tipo de comportamento depressivo pode ter implicações na forma como tratamos a depressão. Se for possível identificar os mecanismos individuais para os diferentes sintomas da depressão, podemos direcionar estratégias terapêuticas futuras específicas para esses sintomas.

A identificação desse gene é interessante porque nem todo indivíduo que passa por estresse crônico, desenvolve a depressão. No entanto, algumas pessoas que experimentam estresse repetido desenvolvem sintomas depressivos.

Por isso, o grupo de pesquisa sugere que a forma como o estresse prolongado pode desencadear a depressão não depende de somente uma via e/ou mecanismo, mas sim, de vários.

Dito de outra forma, a depressão não é “tamanho único”, em que a alteração dos mesmos mecanismos e vias servem para todos os pacientes.

A depressão é um transtorno misto – sintomas diferentes surgem em indivíduos diferentes. Compreender os mecanismos cerebrais subjacentes aos vários sintomas e reconhecer que eles são potencialmente distintos provavelmente abrirá caminho para abordagens de medicina de precisão para tratar sintomas específicos em indivíduos que lutam contra transtornos de saúde mental.

Ref: Brandon W Hughes, et al. (2023) NPAS4 in the medial prefrontal cortex mediates chronic social defeat stress-induced anhedonia-like behavior and reductions in excitatory synapses. eLife 12:e75631. https://doi.org/10.7554/eLife.75631

Marissa G. Schamne
Marissa G. Schamne
PhD | Cientista

Pesquisadora e professora universitária, farmacêutica por formação. Despertou o interesse pela pesquisa durante a faculdade na Iniciação Científica, que obviamente foi na área da neuropsicofarmacologia. Concluída a graduação, segue o caminho da carreira acadêmica e pesquisa até a co-fundação do Rigor Científico – onde encontrou uma maneira de expressar todo seu amor pela Ciência, e vislumbra a possibilidade de levar essas informações ao maior número possível de pessoas. Era uma pessoa tímida que conforme foi se inserindo no meio acadêmico encontrou uma forma de libertar-se dessa timidez, e agora matraqueia sem parar. Apaixonada pela natureza, esportes ao ar livre e a sensação de liberdade que isso traz. Gosta de viajar pelo mundo, seja através dos livros que lê ou das viagens que faz. Almeja alçar vôos mais altos divulgando ciência por aí.

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