A ciência na arte: ‘RADIOACTIVE’

A ciência na arte: ‘RADIOACTIVE’

25 de agosto de 2022

Marie Sklodowska Curie

Em meio ao paradoxo de não sabermos se é a arte o espelho da vida ou se é a sociedade que copia a arte, o fazer científico também se faz presente. A cinegrafia, em diversas obras, apresenta a história da ciência, sendo uma delas a obra intitulada “Radioactive”, um filme baseado na história de vida de Marie Sklodowska Curie: cientista Polonesa, a primeira vencedora de dois Prêmios Nobel em áreas distintas, Prêmio Nobel de Física e Química. O filme perpassa por aspectos de seu fazer quanto pesquisadora, sua vida particular e a busca do lugar da mulher na ciência. 

Radioactive - filme x realidade

Além da seleção incrível dos atores, a produção e o cenário te carregam por uma recriação da instigante Paris do final do século XIX. O roteiro insere o telespectador na vivência da época, sendo que muitas características ainda podemos visualizar na atualidade no âmbito de desenvolvimento científico. Nesse contexto, o filme apresenta diversos aspectos, como as etapas da construção e elucidação de uma hipótese, a configuração de equipe e o trabalho conjunto e a importância do financiamento para pesquisas.
Aprofundando, então, o caráter metodológico apresentado, podemos observar em várias cenas as perguntas que os pesquisadores fazem uns aos outros sobre as características dos elementos que eles estão investigando. Essas perguntas são os problemas iniciais, o que gera curiosidade e que ainda não há explicação, promovendo a formação de hipóteses para determinado fenômeno. A próxima etapa, então, seria delimitar o método científico, a fim de obter resultados fidedignos e atrelando o filme aos relatos, sabe-se que o desenvolvimento das pesquisas de Marie Curie foi complexo até que se estabelecesse técnicas reprodutíveis e confiáveis para a detecção e comprovação da radioatividade. Tal complexidade que é reduzida através da tecnologia, mas não totalmente resolvida.
Mudando para outro momento da pesquisa, em uma cena, o filme apresenta Marie e Pierre Curie, seu marido, em uma comunicação científica da Academia Francesa de Ciências, na qual os dois apresentam o resultado de suas pesquisas. Com isso, é apresentado na obra a importância da divulgação científica, ou seja, quando os resultados já passaram por avaliação e interpretação e eles afirmam a hipótese que foi inicialmente gerada. Além do mais, é relevante compreender a existência de uma comunidade científica, uma vez que ela tem um papel indispensável nos processos da ciência, de avaliar os conhecimentos científicos, criticar o que tem sido desenvolvido, como também instigar a geração de novas ideias. 

Mulheres nas ciências

Um dos aspectos marcantes no filme é o papel da mulher nas ciências. As cenas que apresentam Marie sendo descredibilizada por outros cientistas retratam as dificuldades que as mulheres enfrentaram e enfrentam para serem reconhecidas por seus trabalhos. Em uma das cenas iniciais tem-se um diálogo entre Marie e Pierre, na qual ele a convida para trabalhar em seu laboratório de pesquisa, que era composto por uma equipe inteiramente masculina, de forma que Marie, com receio de julgamentos, demonstra hesitação para aceitar. Outro momento que podemos observar esses aspectos é que, após o falecimento de seu marido, que era professor da Universidade de Paris, Marie recebe o convite para ocupar seu cargo como primeira professora mulher, cena na qual a personagem está novamente diante da coordenação da universidade composta apenas por homens. Um outro ponto a ser discutido, refere-se às duas indicações ao prêmio Nobel, visto que, os grandes gestores da ciência não viam como algo favorável o reconhecimento de uma mulher para ganhar um prêmio que até então era destinado somente a homens. 
Ao analisarmos o modo como a mulher é representada na obra, sua vida pessoal e o contexto no qual ela está inserida interferem em diversos âmbitos ao longo do filme, inevitavelmente integramos a atividade científica com questões sociais, entendendo que a ciência é uma atividade que atravessa suas concepções, levando contextos não somente como objetos de estudo, mas também sendo espaço de condutas geradas pela sociedade. Assim, a apresentação das dificuldades enfrentadas pelas mulheres levanta pautas que instiguem os telespectadores a construir novos pareceres.

O elemento rádio

Em relação a sua descoberta, durante todo o filme a menção ao rádio aparece, com explicações dos conceitos que o envolvem, cenas que provocam reflexões a respeito do elemento e seus efeitos tóxicos causados pela exposição à radiação. Fato que será elucidado por eles somente ao final do enredo através da observação dos sintomas que os próprios Marie Curie e Pierre Curie começaram a apresentar em decorrência do contato com os elementos. Sintomas estes que se agravam e resultam na morte da cien(ar)tista pela própria arte.
Muitos outros pontos poderiam ser levantados em torno da trama, mas para finalizar essa análise pontuo uma cena que reflete de forma simbológica o fazer científico:  Marie observa encantada a emissão de luz do elemento rádio e fala que quatrocentas toneladas de minério resultaram em apenas uma pequena quantidade do elemento, evidenciando que a conquista de resultados científicos também possui limitações, que muitas são as hipóteses criadas e poucas as respostas, muito é o trabalho para uma restrita quantidade de resultados publicados. E nesta mesma cena podemos visualizar sua fala “Estou entre aqueles que acham que a ciência tem uma grande beleza”.
Nota: Muitos aspectos do filme são fictícios e não condizem com a história de vida real de Marie Curie, uma vez que é um filme comercial e não um documentário.
Referências consultadas: 1. COREIA, A. C. V., SIQUEIRA, C. C., SALGADO, S. C. M., COSTA, W. G. C. Radioactive: Análise do potencial do filme como material de Divulgação Científica. Research, Society and Development, v. 11, n. 2, 2022. 2. JAMAL, N. O. & GUERRA, A. O caso Marie Curie pela lente da história cultural da ciência: Discutindo relações entre mulheres, ciência e patriarcado na educação em ciências. Ensaio Pesquisa em Educação em Ciências. v. 24. Belo Horizonte. 2022. 3. Radioactive. Marjane Satrapi. Tim Bevan, Joe Wright, Eric Fellner, Paul Webster. Londres, Studiocanal UK, 2019.
 

Isadora Machinski
Isadora Machinski
Farmacêutica

Mestranda em Ciências Farmacêuticas - UEPG, farmacêutica por formação, professora voluntária, acadêmica de Psicologia e ex-aluna da Certificação Rigor Científico em Neurpsicofarmacologia. Desde o primeiro ano da graduação estava imersa no universo da pesquisa, por meio da Iniciação Cientifica, transitando entre as áreas das Ciências Farmacêuticas até direcionar seus estudos às plantas medicinais. Antes de concluir a graduação em Farmácia, em meio a pandemia de COVID-19, iniciou seus estudos em Psicologia e então nasceu a integração entre etnofarmacologia e neurofarmacologia. Segue, então, o caminho da carreira acadêmica e pesquisa através do mestrado acadêmico aprofundando esse interesse. Encantada pela ciência e apaixonada por lecionar e compartilhar conhecimentos.

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