Com toda certeza você já ouviu falar sobre depressão. Talvez você já tenha tido ou ainda tem, não é incomum e não é motivo de vergonha. Talvez tenha passado por alguns episódios depressivos, dependendo do que aconteceu em determinado momento da sua vida. Talvez você tenha um amigo ou um parente que sofre com esse transtorno. Talvez você já tenha ouvido alguma celebridade ou atleta admitir que sofre com isso. Talvez você não entenda bem como isso acontece. Talvez, mais de uma das alternativas anteriores, talvez todas. O fato é que a depressão é um transtorno sério e por muito tempo as pessoas trataram esse transtorno como algo irrelevante ou imaginário. Há quem diga que as pessoas que admitem estar sofrendo com isso estão se vitimizando ou querendo biscoito (como dizem os jovens na internet). Há quem diga que isso não passa de coisa da cabeça de quem tem. Pois bem meus caro leitores, é sim uma coisa da cabeça, lembra que eu falei que nosso cérebro é tipo um lego? E não, não é porque é um transtorno que acontece no nosso cérebro que a expressão 'coisa da cabeça' deve ser utilizada para desmerecer o sofrimento alheio. Quem aqui nunca ouviu as seguintes frases: “Que depressão que nada, isso é falta de um tanque para esfregar roupa”, “Olha, te garanto que se arrumasse um emprego isso passava rapidinho”, “Tá aí cheia de mimimi, com uma vida ótima, enquanto as crianças lá na África estão passando fome”. Eu poderia listar ao menos mais umas 9 frases que eu já ouvi. Podíamos fazer um bingo, a cada 3 frases que você já ouviu, você grita BINGO. Eu tenho certeza que você vai gritar bingo ao menos uma vez, e em muitos casos, como no meu, vai gritar bingo 4 vezes.
É um buraco, meus queridos leitores. E, bem como na geografia, é real. Não é porque você não vê que a doença não existe. É fácil compreender quando nós vemos uma perna engessada, um olho com um tampão, um braço com uns pinos de metal, ou uma pessoa conectada à máquinas num hospital. É palpável, é visível, é real. Nós temos uma dificuldade maior de entender e processar o que não é visível a olho nu. Quantas vezes você também ouviu os seguintes comentários: “Nossa, mas fulana com câncer, ela sempre pareceu tão bem” ou “Gente, ciclano teve um ataque do coração, não acredito, ele parecia ser tão saudável”. Não é porque os olhos não vêem ou contemplam que o problema não existe. No caso do câncer ou dos ataques cardíacos, as pessoas tem uma maior facilidade de aceitar e empatizar, porque são doenças, em sua maioria, no início silenciosas, porém de acesso diagnóstico mais fácil e que posteriormente podem ser visualizadas com mais objetividade do que a depressão.
É real, os nossos legos são montados de formas diferentes, lembra? Assim como as chuvas, ventos e meteoros podem causar uma depressão na terra, os traumas de infância, as perdas inesperadas e repentinas de familiares, as pressões e expectativas que são impostas no trabalho, e a restrição de vitaminas e proteínas durante a formação do cérebro, podem causar uma depressão na cabeça. O impacto dos agentes causadores é sentido de forma diferente em cada tipo de terra, ela pode ser mais arenosa, rochosa ou argilosa, e vai responder diferente à água, vento ou metal que a abate. Assim também é o cérebro de cada um de nós, com características individuais (genéticas e ambientais) que deixam o nosso solo neuronal (as conexões entre os nosso neurônios) mais arenosas, rochosas ou argilosas, por exemplo, e portanto, cada um responderá de maneira diferente às diversas experiências que nos abatem.
É preciso falar sobre o tema de maneira aberta e sem preconceito. Tira da sua cabeça a ideia distorcida de que depressão é coisa da cabeça de alguém, como se a pessoa tivesse escolha, como se o indivíduo tivesse, por livre e espontânea vontade, decidido ter um transtorno. Sim, acontece dentro da cabeça, porém afeta o corpo todo, a pessoa toda, e muitas vezes as pessoas que estão ao redor, que sofrem junto. É alarmante o número de alunos de pós-graduação e pessoas que trabalham em grandes corporativas – que exigem muitas metas e sacrifícios – sofrendo de depressão. Você deve conhecer algum amigo ou parente nessa situação. É espantoso o número de atletas que passam por isso, você deve ter acompanhado Simone Biles, a ginasta americana, que desistiu de competir em várias provas na olimpíada de Tokyo para priorizar sua saúde mental, ou Michael Phelps, o nadador americano e maior medalhista olímpico, tornar o assunto público e discursar sobre como a depressão afetou a sua carreira e a sua família. É apavorante o número de artistas e celebridades que passam por isso, pessoas que uns poderiam argumentar, têm de tudo, e que ao final de maneira triste acabam por tirar a própria vida, como Chorão e Chester Bennington, vocalistas da banda Charlie Brown Jr. e Linkin Park, respectivamente. Ou ainda, como Robin Williams e Philip Seymour Hoffman, famosos atores americanos. O buraco está entre nós, as vezes, o buraco está em nós. Ridicularizar o tamanho do buraco, ou fingir que ele não existe não vai fazer com que ele fique menor ou que desapareça. Mais empatia consigo mesmo e com o próximo, nossos buracos são diferentes, o mundo precisa de mais preenchedores de buraco e não de escavadores.
Comentários